Por Josiane Wendt Antunes Mafra
Percebe-se que há muitas dúvidas acerca dos negocios imobiliários que circundam os imóveis locados, notadamente quando se fala em sua alienação, isto é, no ato de transferência do domínio de um bem imóvel a outra pessoa. Um dos aspectos – já trabalhados por esta autora – está relacionado ao exercício do direito de preferência do inquilino na aquisição do bem em igualdade de condições com terceiro interessado. Outra questão tormentosa se refere às consequências trazidas à relação locatícia nos casos em que terceiro, alheio ao contrato de locação, adquira o bem locado.
Interessante dizer que a resposta acerca do assunto em comento é encontrada de forma cristalina na própria Lei do Inquilinato (Lei nº. 8.245/1991), em seu artigo 8º, que afirma:
Se o imóvel for alienado durante a locação, o adquirente poderá denunciar o contrato, com o prazo de noventa dias para a desocupação, salvo se a locação for por tempo determinado e o contrato contiver cláusula de vigência em caso de alienação e estiver averbado junto à matrícula do imóvel.
§ 1º Idêntico direito terá o promissário comprador e o promissário cessionário, em caráter irrevogável, com imissão na posse do imóvel e título registrado junto à matrícula do mesmo.
§ 2º A denúncia deverá ser exercitada no prazo de noventa dias contados do registro da venda ou do compromisso, presumindo – se, após esse prazo, a concordância na manutenção da locação.
Ora, em que pese a possibilidade do prévio exercício do direito de preferência do inquilino, em caso de interesse do proprietário/locador alienar seu bem – o que se dará em determinadas condições – é certo que, ultrapassada esta questão, eventual terceiro comprador de um bem locado, sendo estranho à relação locatícia, não estará obrigado a respeitá-la. É neste sentido o farto entendimento de nossos tribunais, senão vejamos:
LOCAÇÃO. AÇÃO DE DESPEJO. ALIENAÇÃO DO IMÓVEL NO CURSO DO CONTRATO DE LOCAÇÃO. DENÚNCIA VAZIA. POSSIBILIDADE. ART. 8.º DA LEI N.º 8.245/91(…) A disciplina contida no art. 8.º e parágrafos da Lei n.º 8.245/91 é clara ao reconhecer o direito do adquirente do imóvel locado à denúncia vazia, desde que haja a notificação do inquilino no prazo de noventa dias contados do registro da venda; ressalvada a vigência da cláusula contratual de tempo determinado; sob pena de presumir-se a concordância com a manutenção da locação.
(STJ – REsp: 674825 PB 2004/0097433-6, Relator: Ministra LAURITA VAZ, Data de Julgamento: 26/05/2009, T5 – QUINTA TURMA).
AÇÃO DE DESPEJO DENÚNCIA VAZIA DEMANDA PROPOSTA PELOS ADQUIRENTES DO IMÓVEL POSSIBILIDADE INTELIGÊNCIA DO ART. 8º DA LEI 8.245/91 VIOLAÇÃO AO DIREITO DE PREFERÊNCIA NA AQUISIÇÃO DO IMÓVEL IRRELEVÂNCIA APELAÇÃO DESPROVIDA.
(TJ-SP – APL: 00023304920108260606 SP 0002330-49.2010.8.26.0606, Relator: Andrade Neto, Data de Julgamento: 12/03/2014, 30ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 13/03/2014).
O que se infere, portanto, é que a transferência da propriedade de um bem imóvel locado poderá implicar na rescisão antecipada do contrato de locação, caso não haja interesse do adquirente na manutenção do vínculo locatício. Daí é que ele estará apto a denunciar o contrato, mas deverá conceder ao locatário/inquilino o prazo de noventa dias para a desocupação do bem. Idêntico direito terá o promissário comprador e o promissário cessionário, em caráter irrevogável, com imissão na posse do imóvel e título registrado junto à matrícula do mesmo.
Apesar da possibilidade supra, a Lei concede ao locatário a possibilidade de ver respeitado integralmente o contrato de locação firmado, isto se o pacto tiver sido feito por prazo determinado, contendo uma cláusula expressa de vigência em caso de alienação e, ainda, estiver averbado junto à matrícula do imóvel. É necessário, pois, reunir todos estes três elementos para que o inquilino tenha o direito de ficar no imóvel até o final do prazo previsto contratualmente. Ausente qualquer destes requisitos/elementos o contrato de locação poderá não ser respeitado e, portanto, mantido pelo novo proprietário do bem.
Não é possível deixar de mencionar que o prazo de noventa dias será contado a partir do registro da alienação ou do seu compromisso e, ultrapassado este prazo, estará presumida a concordância com a respectiva manutenção da locação por parte do novo proprietário, o que, subtende-se, terá se dado nos mesmos termos e condições nas quais fora assinada com o vendedor – o anterior proprietário/locador.
Estes são os contornos gerais da questão colocada. Situações inusitadas poderão acontecer, devendo as partes, corretores, advogados e quaisquer pessoas que trabalhem no e com o mercado imobiliário estarem atentos às suas nuances.
Saiba mais sobre a autora deste artigo
Josiane Wendt Antunes Mafra, Advogada graduada pela Universidade Federal de Viçosa (UFV/MG), assessora e consultora jurídica, especialista em Direito Público e mestre em Meio Ambiente e Sustentabilidade (UNEC) Pós-graduanda em Direito Urbanístico e Ambiental e em Planejamento (PUC-MG), Implementação e Gestão de Cursos de Educação a Distância (UFF-RJ). Articulista, parecerista e conferencista.Com experiência, há mais de 13 anos, junto ao mercado imobiliário, urbanístico, turístico e ambiental. Escritório Mafra e Antunes Advocacia e Consultoria ( http://www.mafraeantunes.com.br ). E-mail: josiane@mafraeantunes.com.br. Blog: http://josianemafra.zip.net. Linkedin: Josiane Wendt Antunes Mafra. Twitter: @josianemafra.